“Here to celebrate!” é o lema oficial do primeiro Campeonato da Europa sénior composto por 24 seleções a ser organizado apenas por um país. De 10 a 28 de janeiro, na Alemanha, vai celebrar-se principalmente o Andebol, mas também conquistas, reconhecimento e oportunidades. Que o digam Roberto Martins e Daniel Martins. Irmãos, amigos, árbitros e, oficialmente, os únicos portugueses a figurarem nos quadros de arbitragem do EHF Euro 2024. No total, a Federação Europeia de Andebol (EHF) depositou total confiança em 18 duplas, originárias de 16 países, entre os quais, Portugal, com os ‘irmãos Martins’ em grande plano e em estreia absoluta.
“[Esta nomeção] Significa um reconhecimento de um trabalho que temos vindo a desenvolver nos últimos anos. Depois de cinco Europeus da formação, chegou a hora de iniciarmos no nível sénior. Para nós é um marco importante.” – afirmou, orgulhoso, Roberto Martins, o mais novo da dupla.
Daniel, de 42 anos, e Roberto, de 41, para além da ligação familiar que os une para a eternidade, partilham a paixão pelo Andebol e caminham juntos no mundo da arbitragem há 23 anos, 14 deles enquanto internacionais. No currículo já ninguém apaga a presença em cinco Europeus da formação, EHF Champions League e Final Four da EHF European League. São já mais de 130 jogos a nível europeu. 2024 é o ano em que surge a maior das oportunidades, a de estar presente num Campeonato da Europa sénior. Reconhecem que a notícia da nomeação não foi uma completa surpresa, não só porque acreditam no profissionalismo e qualidade no desempenho das suas funções, mas também porque a trajetória ascendente nos últimos anos fazia crer que o momento estava próximo. E sempre esteve nos planos.
“Sempre foi um objetivo chegar ao patamar sénior das Seleções Nacionais e isso foi, agora, conseguido com muito trabalho, sacrifício e persistência. Quando soube da notícia fiquei feliz. No fundo, estávamos à espera de que este ano pudéssemos ser escolhidos para ir ao Campeonato da Europa.” – assume Daniel Martins, justificando com o sucesso “das últimas três épocas”, no qual dirigiram, entre outros jogos de relevo, a Final do Europeu sub-19 em 2021 (Croácia x Alemanha), uma Meia Final do Europeu sub-20 em 2022 (Suécia x Sérvia) e uma Meia Final da EHF European League [EHF Finals 2023] (Montpellier HB x Füchse Berlin). Depois disto, “era a altura de apostarem em nós num Europeu sénior.” – afirma Roberto. A presença no “maior palco do Andebol Europeu”, para Daniel, “significa que todo investimento que nós fizemos ao longo de 23 anos e a nossa qualidade são reconhecidos.”
No Verão de 2021, mais concretamente a 22 de agosto, Daniel e Roberto dirigiram a estrondosa derrota da Croácia, em casa, para coroar a Alemanha como Campeã Europeia no escalão sub-19 masculino (Europeu sub-18 havia sido cancelado devido à pandemia). A presença nesse jogo mais importante daquela competição foi o ‘clique’: “O ponto de viragem, em que nós achávamos que podíamos atingir o pico da nossa carreira, que é estar no Europeu sénior, foi na Final do Europeu sub-19. A partir daí, e depois de tudo o que seguiu, sentimos que a Federação Europeia de Andebol conta connosco para tudo e vamos agarrar isto com unhas e dentes.” – refere Roberto.
Sem grandes dúvidas de que há “um grande foco apontado ao Europeu, porque é onde estão as melhores seleções e os melhores atletas” [Daniel], e apesar de ser a estreia, o sentimento é mútuo no que toca à pressão: não existe. “Nós levamos esta atividade muito a sério e a pressão que sentimos é exatamente a mesma, é a pressão de não errar, de tentar fazer o melhor possível e que o andebol saia sempre a ganhar.” [Roberto]
Sem conhecerem ainda as atribuições da arbitragem para os jogos, no que toca às metas traçadas, o elemento mais novo da dupla Accoto Martins [Roberto], fala em ambição… controlada: “Sendo o nosso primeiro Europeu sénior, esperamos fazer dois jogos na Fase de Grupos. Depois, como somos muito competitivos e também um pouco exigentes connosco, esperamos também chegar ao Main Round.” O irmão, Daniel, vai mais longe: “Chegar o mais longe possível é sempre a nossa meta, ou seja, a Final há de ser sempre ser o nosso grande objetivo.”
No início do mês de novembro, Daniel e Roberto tiveram um “convite muito honroso” para participar na Semana do Andebol, na Alemanha, onde arbitraram dois jogos particulares entre a seleção organizadora do EHF Euro 2024 e a congénere do Egito, de preparação para a grande competição. O segundo duelo decorreu no emblemático Olympia Halle, em Munique, teve lotação esgotada (12.500 espetadores) e foi o ponto de partida para a estreia.
No Europeu da Alemanha, Portugal estará representado pela Seleção Nacional A Masculina, para além de Roberto Martins e Daniel Martins. Quando o tema são os Heróis do Mar, a palavra ‘sucesso’ geralmente tem lugar na conversa e os árbitros portugueses acompanharam de perto o crescimento de muitos dos atletas que, hoje, se afirmam na elite do Andebol nacional. “Há jogadores que fizeram connosco esta jornada que é o Andebol, desde quando iniciámos a nossa carreira internacional e começámos a arbitrar as seleções desde os sub-16 até aos sub-20. Jogadores como Tiago Rocha, José Costa, Pedro Portela, Rui Silva ou Fábio Magalhães, são alguns dos quais fomos acompanhando o crescimento e a evolução e fomos crescendo e evoluindo com eles também. Desde cedo que se via que eles iam ter um grande futuro e o presente confirma isso mesmo.” – revela Roberto.
Para além de atletas, treinadores e membros do staff técnico da Seleção Nacional, a arbitragem portuguesa tem o seu merecido espaço entre os melhores. Um sentimento de compromisso, responsabilidade e gratidão: “Representar Portugal nos maiores palcos é gratificante. Temos vindo a fazê-lo nos últimos 14 anos e sempre que vemos que somos responsáveis pelo hastear da nossa bandeira no pavilhão, ficamos sempre gratos também à modalidade que nos permite representá-la e é um orgulho enorme representar o nosso país.” – refere Daniel.
“Estamos na melhor fase da nossa carreira, sem dúvida. Com a maturidade suficiente para encarar estes jogos de alto nível com muita tranquilidade.” – Roberto Martins não tem dúvidas. A dupla de Pombal prepara-se agora para desbloquear o patamar mais alto no que às competições de seleções diz respeito, algo que já conhecem – e não esquecem – no contexto de clubes. A 2 de dezembro de 2021, na ressaca da pandemia, o duelo da Ronda 9 do Grupo A da EHF Champions League, entre THW Kiel e HC Vardar, teve arbitragem portuguesa e a respetiva e aguardada estreia dos irmãos Martins. Era, nada mais, nada menos do que o Match Of The Week, numa das catedrais do Andebol: a Arena de Kiel.
Roberto Martins confessa que já haviam sido informados de que a estreia na maior competição de clubes iria acontecer mais cedo ou mais tarde nessa época de 2021/2022. A dupla portuguesa estava pronta para dar esse passo e, apesar da estreia ter sido num jogo entre duas equipas consagradas, que haviam erguido o troféu não há muito tempo (HC Vardar em 2018/2019 e THW Kiel em 2019/2020), o único caminho era em frente. “Emocionalmente não mexeu muito connosco, posso confessar. Era um dos objetivos, estávamos mais do que preparados para iniciar a Liga dos Campeões e era mesmo só uma questão de tempo. Foi o primeiro, foi no pavilhão do Kiel, que é sobejamente conhecido como uma das arenas com o melhor ambiente a nível mundial. Foi uma estreia fantástica.” [Roberto]
“Apesar de ser em altura de pandemia, a Arena de Kiel recebeu 7 mil espectadores, num palco com capacidade para cerca de 13 mil. Foi fenomenal. Mas assim que nós entrámos em campo, conseguimos abstrair-nos do ambiente e de tudo o resto, e conseguimos focar-nos apenas na gestão do jogo.” [Daniel]
No que concerne à EHF Champions League, e quando questionados se é possível sonhar com a presença na Final Four da competição, como apenas duas duplas portuguesas o fizeram até então, a ambição e a crença total no trabalho voltaram a falar mais alto: “Se nós conseguirmos manter as nossas prestações, acredito que, num curto espaço de tempo, podemos marcar presença, tal como as duas duplas portuguesas que já o conseguiram [Eurico Nicolau/Ivan Caçador em 2013 e Duarte Santos/Ricardo Fonseca em 2019].” – admite Daniel.
Até ao dia de hoje, contabilizam oito jogos na maior prova europeia de clubes, três deles realizados na época que agora decorre.
Os lusos frisam o facto de serem árbitros ‘Europeus’ e, por isso, não estão elegíveis para arbitrar Campeonatos do Mundo, Jogos Olímpicos ou outra qualquer prova da égide da Federação Internacional de Andebol (IHF). “Nós somos realistas, somos apenas árbitros da Federação Europeia de Andebol e os Campeonatos da Europa são o nosso ‘target’. Portanto, neste momento, arbitrar a Final de um Europeu é a nossa ambição e onde pretendemos chegar.” – garante Daniel Martins e Roberto complementa: “Queremos marcar a presença assídua nos próximos Europeus e estar o resto dos anos que nos faltam na arbitragem no patamar máximo.”
Olhar em frente é também abraçar o passado. Para Roberto Martins, “as experiências passadas tem um grande impacto no nosso plano atual, as boas e as menos boas, que nos fizeram crescer e chegar a este nível. Aprendemos com todas as experiências ao longo da nossa carreira.”
A dupla internacional portuguesa tem os seus ideais bem definidos e as gerações mais jovens que tenham em vista uma carreira na arbitragem têm sempre as portas abertas: “Podemos ser um exemplo de como a persistência, o esforço e a dedicação nos pode levar ao topo, neste caso do andebol europeu.” – diz Daniel. “Temos muitos árbitros jovens que falam connosco, que nos pedem ajuda e opiniões, e estamos sempre abertos a ajudar e a partilhar a nossa experiência com eles. Temos a noção de que somos uma referência para os mais novos, também pela nossa forma de estar e de trabalhar.” – completa Roberto.
O futuro é amanhã e o EHF Euro 2024 está prestes a começar.