Rita Machado e Soraia Lusquiños: Passaporte internacional honra uma década de parceria

Árbitras portuguesas já dirigiram duas Finais da Taça de Portugal Feminina mas é no Andebol de Praia que têm recebido as melhores oportunidades. Recentemente foram a única dupla lusa na EHF Champions Cup 2024, no Porto Santo.

“Costumamos dizer que as duplas de arbitragem são como os casamentos. Não dá frutos se não estivermos comprometidos.” E assim é há uma década. Rita Machado e Soraia Lusquiños nasceram no mesmo ano, partilham a mesma paixão pelo Andebol, e após 10 anos de carreira tornaram-se árbitras internacionais. De atletas “rivais” a amigas, a parceiras, a árbitras internacionais. Mesmo contra as probabilidades.

Ao início não foi fácil. Eu e a Soraia sempre fomos rivais, como atletas, e quando me colocaram o primeiro jogo com ela, achei que estavam a brincar. Isto porque eu só tirei o curso por sugestão de um amigo e tinha zero ideias de seguir com a arbitragem, a não ser fazer uns jogos com ele, coisa que nunca aconteceu [risos]. A verdade é que tudo correu melhor que o expectável e percebemos que tínhamos uma visão muito parecida do jogo.” – admite Rita. Uma opinião partilhada por Soraia, que diz que talvez tenha sido o instinto, mas que não podia ter sido de outra forma: “Não foi uma ligação imediata mas também não foi nada difícil. Sem dúvida a melhor escolha.”

A dupla da Associação de Andebol do Porto considera-se humilde e trabalhadora e acredita que a experiência acumulada ajuda a trazer melhores resultados. O foco inicial até era o Andebol tradicional, apesar da paixão de ambas pela praia, mas as coisas foram seguindo num caminho alternativo, num crescimento conjunto a todos os níveis. “Não somos nada nem atingimos objetivos se uma de nós ficar para trás. Temos de estar sempre lado a lado, no mesmo patamar.” – admite Soraia. O Andebol de Praia foi uma agradável surpresa, mas aos 32 anos ainda há muita estrada para andar: “Se conseguirmos traçar no indoor o mesmo caminho que estamos a traçar no Andebol de Praia seria incrível! Mas sabemos que é muito difícil. Tanto pelas vagas, como pela nossa idade.”

Em jeito de retrospectiva do início da carreira, Rita Machado não tem dúvidas: “As expetativas foram mais do que superadas. Nunca pensámos que podíamos chegar tão longe.” Presença assídua no Campeonato Nacional 1ª Divisão Feminina, duas Finais da Taça de Portugal Feminina, Campeonato Placard Andebol 1 e duas competições internacionais de Andebol de Praia, entre outras. É só o começo.

O ano das oportunidades

2024 está a ser um ano gratificante e recheado de recompensas por todo o trabalho realizado na última década e com ele trouxe as insígnias da Federação Europeia de Andebol. Concluído com sucesso o “17.º Curso de Árbitros de Andebol de Praia”, que decorreu no passado mês de junho, em Lacanau (França), e onde Rita Machado e Soraia Lusquiños se estrearam nas competições internacionais (EHF ebt Finals 2024), foi aberta a porta para novas aventuras e experiências além fronteiras. Em Lacanau foi uma incrível aventura. Era tudo novo para nós e, por isso mesmo, queríamos absorver todos os conhecimentos e também mostrar um bocadinho do que podíamos fazer. Nomearam-nos para bons jogos (incluíndo uma Meia Final e um jogo de atribuição de 3.º/4.º lugares) e sem dúvida que nos divertimos imenso.” – referiu Soraia. Rita acrescenta: “Foi uma semana super intensa, mas parece que viemos com uma bagagem muito maior do que a que levamos.”

Numa competição em que uma equipa portuguesa ergueu o troféu, a EFE Os Tigres, o balanço da prestação de Rita Machado e Soraia Lusquiños foi “bastante positivo” e “os feedbacks dados e as nomeações para jogos importantes mostram isso.”

Integrar os quadros de arbitragem da Federação Europeia de Andebol “é entrar numa grande família, é de um prestígio e uma honra enormes” mas é, ainda, uma recompensa por todo o trabalho e uma realização pessoal, confessa Rita Machado. “Porque ser árbitro não é só entrar em campo ao fim de semana. É todo o trabalho dos treinos ao longo da semana, de visualizações de jogos, de trabalho teórico, etc. a serem recompensados e, principalmente, de muita coisa que se abdica.” – conclui. Para Soraia, “é o concretizar de um sonho.”

Quando se fala em referências, a opinião é unânime: Sem dúvida que o Eurico Nicolau é uma das nossas maiores referências desde o começo.”

EHF Champions Cup 2024: A única dupla portuguesa

Das oito duplas nomeadas pela Federação Europeia de Andebol, apenas Rita Machado e Soraia Lusquiños representaram o nosso país, nas areias do Porto Santo. Mário Coutinho foi também o único português entre os oito delegados EHF nomeados. O GRD Leça sagrou-se campeão na vertente masculina, para fechar com chave de ouro um evento importante para o Andebol luso.

“Foi de um peso e responsabilidade enormes. Isto porque, em termos de experiência, éramos as mais novatas e sabíamos que íamos partilhar o campo com árbitros muito experientes e de nível de topo! O que na verdade nos motivou imenso, porque não gostamos de ‘ficar para trás’, e porque queríamos fazer uma boa prestação. Foi ainda maravilhoso conhecê-los.” – afirma Rita Machado.

Com as equipas portuguesas a dar cartas no areal do Porto Santo, como já tem sido hábito, Soraia Lusquiños confessa que as emoções estavam ao rubro: Vimos todos os árbitros a aplaudir durante um jogo de uma equipa portuguesa pelo espetáculo que estavam a dar e é muito, mas muito gratificante.”

Depois de cumprida mais uma etapa, há que continuar a sonhar: Um árbitro quer sempre mais, por isso esperamos sempre novas nomeações. Ainda melhor seria conseguirmos atingir o patamar máximo na arbitragem, chegar à IHF.” – refere Soraia.

Indoor: Somar pontos no plano interno e superar obstáculos

No Andebol tradicional, as presenças nas principais competições nacionais têm sido constantes depois da subida ao nível de elite. Do masculino ao feminino, destacam-se duas Finais da Taça de Portugal, ambas com o Madeira SAD como vencedor: a primeira, em Vila Real, frente ao ARC Alpendorada, na época 2020/2021; e a segunda, em Santo Tirso, contra o SL Benfica, três temporadas mais tarde (2023/2024).

Para nós foram nomeações importantes, não deixavam de ser finais e mostraram a confiança que depositam em nós. Queríamos fazer uma ótima prestação e ajudar no espetáculo que é o Andebol.” – refere Soraia.

Já não faltará muito tempo para completar o puzzle, acredita Rita: “Os objetivos agora são novas nomeações em momentos/competições ainda não realizadas. Estamos a fazer os “check” um por um. Ainda está em falta uma Supertaça [risos].”

Integraram o EHF Young Referee Programme, destinado aos jovens árbitros europeus do futuro, que as levou a Praga (Chéquia) para um torneio de oito dias de trabalho prático em constante observação e avaliação por parte dos responsáveis, mas a pandemia contribuiu para que tivessem que abandonar o programa, sendo agora candidatas, mas a ambição de chegar às competições europeias, ou mesmo provas de Seleções Nacionais, mantém-se mas de forma calculada. “Isto significa que no indoor ainda não somos EHF, mas que podemos, a qualquer momento, ser chamadas para fazermos algumas competições para realizar o curso. Por isso, poderá ser difícil, mas é possível.” – diz Rita.

Outro dos obstáculos que tem dificultado um crescimento continuo na carreira de Rita e Soraia são as lesões. “Tiraram-nos algumas oportunidades, tanto nacionais como internacionais. E as lesões são sempre algo que não afetam só o físico, mas também o psicológico. A cada lesão sucedida, é sempre mais um recomeço.”

O Andebol e a Vida, lado a lado

Quando questionadas acerca daquilo que as motiva diariamente, Rita Machado fala de uma vontade que vai assumindo proporções maiores à medida que os degraus vão sendo escalados. “O gosto pela modalidade e o gosto que fomos ganhando pela arbitragem. Nem sempre foi assim, mas é um bichinho que vai ganhando muito poder à medida que vamos apitando cada jogo e ultrapassando cada etapa. É um jogo de desafio e auto-superação. Quando damos por ela, queremos sempre mais, queremos sempre um novo objetivo.” – e Soraia completa: “É na arbitragem que podemos fazer um bocadinho a diferença nos jogos que dirigimos e nas pessoas que nos rodeiam.”

Quando não estão em funções nos 40×20, Rita Machado, consultora/gestora financeira, e Soraia Lusquiños, colaboradora no Hospital Santa Maria, estão também a trabalhar para o Andebol, mas há mais coisas importantes que não devem ser colocadas de parte. Conciliar tudo “não é fácil. Às vezes nem nós sabemos.” – afirma Rita. “Gostávamos que os dias tivessem mais de 24 horas, porque como já referi, o Andebol não exige apenas que entremos em campo, por vezes, entre 3-6 vezes por fim de semana, exige trabalho diário. E temos ainda que arranjar tempo para o extra-Andebol, especialmente para a nossa profissão, família, amigos e, ainda, mas não menos importante, nós próprios.” – rematou.

Para Soraia Lusquiños, é ainda mais difícil gerir tudo, mas não há nada que não se consiga com amor e dedicação: Não é nada fácil para mim porque parece que nunca temos tempo para tudo o que queremos ou temos de fazer. Eu com um filho pequeno ainda sinto mais a dificuldade porque nunca quero negligenciar o tempo que tenho para ele, que já acho pouco. Mas é preciso regrar um bocado, focar e pensar que ele mais tarde irá perceber e orgulhar-se da mamã.”

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